sexta-feira, 6 de junho de 2008

Rock in Rio 2008 - 5 de Junho

Posso ser (muito) suspeito para falar, mas há algo de mágico nos momentos que antecedem um concerto dos Metallica, que por si só fazem valer a experiência, que a eles não se limita. É uma mistura entre o nervosismo antes da entrada de um artista em palco e a admiração e felicidade de um miúdo que abre as prendas de natal.

No "dia do metal" - não percebo lá muito bem esta restrição, parece que vamos a um freak show ou a um clube privado bastante redundante, mas adiante - da terceira edição em solo nacional do célebre festival, além dos cabeças de cartaz Metallica, actuaram no Palco Mundo os Moonspell, os Apocalyptica e os Machine Head, que não tive oportunidade de ouvir.

Moonspell


Apesar de já ter assistido a vários concertos da banda portuguesa e de ser um fã há muitos anos, estava à espera de ficar impressionado com a actuação de ontem, o que não aconteceu. Fica a confirmação da sensação que os Moonspell têm, como de resto a generalidade das bandas do estilo, andado a chover no molhado nos últimos anos. Desde o álbum The Antidote (2003), a partir do qual caminhou em direcção ao notável sucesso aquém e além fronteiras, não houve, ao contrário do que se passara até então, uma procura por novas sonoridades, sendo notória a aposta da banda na continuação lógica do seu trabalho em detrimento da diversidade e dinâmica. Ao que parece, os Moonspell e o público gostam, mas pessoalmente acho que - e isso reflectiu-se ontem - há aspectos que começam a parecer demasiado forçados e encenados, e todos eles têm capacidade para fazer melhor. Mas é sempre um prazer ouvir músicas como Opium, Mephisto, Alma Mater ou Everything Invaded. Mais uma vez, como em 2004, os Moonspell foram vítimas do horário - eles não são decerto uma banda para dar um concerto debaixo de um intenso solo de Verão. Que é das, e passo a citar, "pessoas que vivem sob o eterno feitiço da lua cheia" (ou algo assim)?

Apocalyptica


Lembro-me do meu fascínio quando ouvi, por volta do lançamento do álbum Cult (2000), as covers de Metallica dos dois primeiros álbuns e a mistura de melodia e metalada (no óptimo sentido) conseguidas pelos quatro violencelos. Os Apocalyptica são agora uma banda mais pesada e mais desenvolvida, e voltaram a deixar-me boquiaberto. A mim e à grande maioria das pessoas que assistiram ao concerto de ontem. Nos primeiros momentos da música inicial, uma cover da Refuse/Resist dos Sepultura, ouvi a malta atrás de mim dizer "O quê? Mas espera lá, os gajos não tocam com guitarras??" Durante o espectáculo foram conquistando o público, que se rendeu à originalidade dos finlandeses e à sua presença em palco. Uma prova de que há sempre algo a aprender e a fazer. Os único aspectos menos positivos do concerto for uma interpretação algo desenquadrada da Quinta Sinfonia de Beethoven e alguma confusão na amplificação e projecção do som, embora seja difícil fazer melhor dado o registo dos instrumentos. Mas de resto, foram fantásticos.

Metallica


O que é que se diz duma banda com quase 30 anos de história, muitas dezenas de milhões de discos vendidos, uma influência directa e incontornável sobre várias gerações, e milhares de concertos dados? Que tal dizer que continuam a ser uma agradável surpresa?
Em primeiro lugar, há que destacar o profissionalismo dos senhores. A qualidade do som foi completamente diferente do resto. A qualidade de imagem - muito por culpa do ecrã especial - foi completamente diferente do resto. A qualidade da iluminação foi completamente diferente. E do número artístico em si - com efeitos pirotécnicos e fogo de artifício à mistura - nem se fala.
Depois, uma banda do estatuto dos Metallica, e das certezas em relação à(s) música(s) que ele implica, não precisava de ter aquela entrega em palco, não precisava de lidar com o público de igual para igual, não precisava de ter como pensamento e vontade principal proporcionar aos ouvintes (que, durante o concerto, fazem parte dos Metallica) momentos inesquecíveis - mas fê-lo. É isso que faz dos Metallica os Metallica. E é por isso que sempre tiveram o apoio do público - que ontem cantou tudo do início ao fim.
Foi muito bom ver o Kirk muito perto da forma de antigamente e sem medo de tocar os solos impossíveis ao vivo - parece-me que alguém andou a fazer escalinhas... Mesmo em relação à sua imagem de marca, o pedal de Wah, já se conteve bastante mais que num passado mais recente, o que, a meu ver, é óptimo. Também os problemas com a voz do James (sAaaAaaaAAAaint anger RooOund my neck...) foram ultrapassados, tendo ele estado impecável a esse nível - mesmo quando não cantou a letra certa acertou nas notas... De resto, de notar também um grande entrosamento entre os quatro, e uma evolução clara desde a entrada de Rob Trujillo em 2003, sendo que eles funcionam agora, mais que nunca, como uma banda. São excelentes notícias para o futuro próximo.
Quanto à escolha dos temas - e dispensando as guerrinhas do tipo "ai, o Master of Puppets é que é bom" - foi mais eclética (em relação à de 2007), com a inclusão de temas do Load (1996) e do Reload (1997), como "Bleeding Me" (que sempre quis ver ao vivo) e "Devil's Dance" e covers clássicas como "Last Caress" dos Misfits e "So What" dos Anti-Nowhere League.
Tudo isto faz com que goste cada vez mais de Metallica, apesar de toda a música que tenho feito e ouvido. É como uma limpeza espiritual através dum gerador de alta tensão. E faz com que não dispense o próximo (o quarto) concerto, prometido por Lars para o próximo ano, na tour do novo álbum.

Uma nota final para a organização, que esteve bem melhor que nos dois Rock in Rio anteriores - as entradas e saídas estiveram mais fáceis, as casas de banho são de luxo quando comparadas com o buraco fedorento de despojos humanos que atordoava os mais aflitos, houve mais e melhores actividades para quem quis, e as zonas de alimentação foram mais eficientes - apesar dos preços inflacionados da comida e da cerveja. Tudo por um mundo melhor.

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