No século XX - e suponho que também noutras épocas - há alguns compositores que poderiam ser chamados, com toda a propriedade, marginais. Desenvolvendo o seu estilo praticamente isolados do resto do mundo, alheios às preocupações mais características do seu tempo, são mais tarde redescobertos e inspiram novos desenvolvimentos. Lembro-me, na primeira metade do século XX, de Varése e, na segunda, de Scelsi e de Nancarrow.
Este último - Conlon Nancarrow - começou a compor, a partir da década de 1940, uma série de peças para pianola, escrevendo directamente nos rolos perfurados (só mais tarde a sua música seria transcrita para notação convencional) - note-se como é uma técnica em tudo similar a quem escreve hoje directamente instruções midi num qualquer sequenciador. Sem entrar em muitos detalhes, é uma música de uma incrível complexidade rítmica (os compositores, embora geralmente sádicos em relação aos intérpretes, como é sabido, ainda se contêm um pouco - ora, com um sistema automático de execução, podem dar livre curso ao seu sadismo e loucura latentes...); já o aspecto melódico e harmónico é geralmente criticado por ser primitivo e popular (esta última parte nunca é explicitada, mas está sempre implícita...) o que, quanto a mim, é bastante injusto (a identidade desta música depende precisamente disso).
Alguns exemplos:
Study no.5 for player piano (reparar o inacreditável crescendo de textura!)
Study no. 11 for player piano
A partir dos anos 70, esta música veio a influenciar a obra de muitos compositores, desde logo Ligeti e Grisey. Vejam lá se esta peça não tem algo a ver com as anteriores:
Ligeti - Étude nº 1 "Désordre" (por falar em atitudes sádicas dos compositores face aos intérpretes...)
quarta-feira, 21 de janeiro de 2009
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3 comentários:
"note-se como é uma técnica em tudo similar a quem escreve hoje directamente instruções midi num qualquer sequenciador"
o paralelismo é interessante, com tudo o que acarreta.
O mais curioso é que apesar de ter sido escrito dessa forma, a partir dos anos 70/80 muitos músicos começaram a fazer transcrições para instrumentos "reais" e - o que é ainda mais surpreendente - a conseguir realmente tocar (:O). Existem arranjos para piano a quatro mãos, para ensembles vários, para quarteto de cordas... Por isso, quanto ao paralelismo, pode ser que daqui a uns anos se faça o mesmo em relação a um qualquer desconhecido que ande agora a trabalhar com base em sequenciadores... Não me admiraria...
sim, era como se uma banda pegasse na demoscene (que o telmo falou aqui http://is.gd/gPco) e tocasse mesmo as cenas.
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